O mês de setembro já é reconhecido por uma cor e um significado. Nesta época, o amarelo predomina na iluminação de pontos turísticos e fachadas de instituições e um laço nessa cor é estampado por toda parte para acender o alerta para uma causa nobre: a campanha de conscientização sobre a prevenção ao suicídio. Criada em 2015 pelo Centro de Valorização da Vida (CVV), Conselho Federal de Medicina (CFM) e Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP), a campanha tem a proposta de associar a cor ao mês que marca o Dia Mundial de Prevenção do Suicídio, comemorado em 10 de setembro.
De acordo com a Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP), 50% dos suicidas têm alguma doença mental identificada, não tratada ou tratada de maneira inadequada. Mas, há diversos motivos que levam uma pessoa a chegar ao ponto de cogitar a decisão extrema do autoextermínio. Liza Fensterseifer, professora da Faculdade de Psicologia da PUC Minas, explica que esse ato é sempre é uma escolha dolorosa, solitária e que implica na desistência da vida em função da presença de um sofrimento e de um sentimento de desamparo e desesperança intensos. Por isso, sempre deve ser visto como um evento complexo e multifatorial. "Ainda que exista um conjunto de sinais e de fatores de risco que são comuns em comportamentos suicidas, não se pode afirmar com precisão quais são os principais fatores que agem de forma conjunta para provocar o comportamento suicida. A forma com que estes fatores interagem para predispor o sujeito ao comportamento autodestrutivo é sempre algo singular", afirma.
No entanto, alguns sinais podem ser observados e tomados como indicativos de maior risco: isolamento afetivo e sentimento de solidão, sentimento de desamparo e desesperança, presença de depressão, excessiva autodesvalorização e autoculpabilização, relações familiares fragilizadas, abuso de álcool e/ou drogas, aquisição de meios ou providências para morrer por suicídio.
A psicóloga observa que, na sociedade ocidental, o suicídio sofre grande influência religiosa, moral e cultural, levando a sua discussão para um patamar quase proibido. "Trata-se de um tabu, de algo envolto em estigmas, o que faz com que as pessoas tenham a ideia equivocada de que evitando falar sobre o assunto, evita-se essa prática. Não falar sobre as coisas não faz com que elas mudem. Logo, a melhor forma de prevenir o suicídio é falando sobre isso", afirma.
É neste momento que campanhas de conscientização e de auxílio são fundamentais, tanto para quem sofre quanto para familiares e amigos que acompanham esse sofrimento. O Centro de Valorização da Vida (CVV) realiza apoio emocional e prevenção ao suicídio, atendendo de forma voluntária e gratuita pessoas que querem e precisam conversar, pelo telefone 188, e-mail ou chat 24 horas no cvv.org.br. As conversas são sigilosas e a identidade de quem entra em contato é preservada.
Mas, é importante ressaltar que essa discussão não deve se ater apenas ao mêsde setembro. "É fundamental haver este momento de conscientização, mas não devemos esquecer que o suicídio deve ser pauta de reflexão e preocupação o ano todo. Neste contexto, há que se investir e fomentar políticas públicas efetivas, pautadas em ações preventivas continuadas, qualificação de profissionais para um atendimento humanizado e sensível, que ofereça apoio, acolhida e conforto ao sujeito, para que possa falar dos seus sentimentos e pensamentos, que por vezes são silenciados", ressalta a professora.
Promoção da saúde e bem-estar
Assim como o suicídio é um tema que deve ser naturalizado, é necessário que a necessidade de se priorizar a saúde mental seja um assunto cada vez mais discutido, pois, é por meio da promoção de saúde e bem-estar que essa triste estatística pode ser atenuada. Para Liza, a forma de enfrentar as pressões externas tem uma relação direta com as pressões internas de uma pessoa, com sua forma de ver e perceber o mundo e o seu valor, com suas características e recursos de personalidade. "A sociedade atual valoriza muito a produtividade e o consumo e, neste contexto, muitas vezes pode ser difícil não sucumbir às exigências que nos sãos impostas. Como a forma de lidar com elas é singular e depende de cada um, não há uma receita pronta e única que, se aplicada, evitará que as pressões do dia a dia custem a saúde mental de alguém", explica.
Ainda que não haja uma fórmula pronta para lidar com as exigências da vida moderna, a psicóloga aponta para algo que, certamente, faz a diferença: encontrar espaços para falar abertamente sobre fragilidades e dificuldades, sem receio ou julgamento, de modo que quem esteja passando por essa situação possa ser ajudado. "Um espaço no qual se possa ser acolhido e escutado de maneira respeitosa, cuidadosa e séria. Em casos mais graves, deve-se auxiliar a pessoa a se vincular a um sistema de saúde e a algum tipo de acompanhamento feito por profissional qualificado", orienta Liza. Como afirmou Osaka à revista americana Time às vésperas das Olimpíadas, "está tudo bem não estar bem".
O melhor caminho para, então, ficar e permanecer bem é, de acordo com a professora, o fortalecimento da saúde mental, de modo a favorecer que as pessoas aumentem seu repertório de recursos psíquicos para enfrentar as dificuldades e sobreviver às pressões. "Ter certeza de nosso valor como pessoa, independentemente de nosso nível de produção e perfeição, é essencial para uma vida plena, feliz e dotada de sentido", afirma. Reconhecer a importância de cuidar e olhar para si é o primeiro passo para, de fato, aplicar isso.
"A promoção do bem-estar e do autocuidado pode passar por pequenas atitudes, que envolvem a retomada de atividades e práticas que dão prazer, reservar um tempo para si, para fazer o que gosta. Claro que em algumas situações, exigirá o engajamento em alguma modalidade de intervenção e apoio profissional, mas ele pode começar com pequenas atitudes de investimento e dedicação a si mesmo", orienta a professora, que pondera que a busca para se alcançar uma vida equilibrada também é particular. "Cabe a cada um encontrar a sua receita. Mas acredito que ela sempre envolverá, em alguma medida, a atenção e valorização de si mesmo, com o emprego de estratégias de autocuidado, de promoção da autoestima e de resiliência".
É justamente essa segurança proporcionada pelo autoconhecimento que dá às pessoas condições de enfrentarem os gatilhos que geram ansiedade e outros sofrimentos mentais. "É preciso estar emocionalmente mais fortalecido, mais desprendido destas marcações sociais e culturais ancoradas na imagem, na produtividade, no consumo, na supervalorização da beleza. É fácil não se sentir à altura destas exigências e aí, qualquer elemento a mais, qualquer adversidade ou dificuldade acaba por predispor o sujeito a comportamentos disfuncionais", afirma Liza, que reforça a importância de buscar formas e garantias de seu reconhecimento, por meio da resiliência, da autoestima e do autocuidado, a despeito de quaisquer exigências. "Temos valor mesmo quando não somos perfeitos", pontua.
Assessoria de Imprensa
PUC Minas