Das 4,8 milhões de crianças de zero a 11 anos em estado de pobreza no Brasil, mais de um milhão encontra-se numa situação muito mais severa, classificada como pobreza multidimensional. Esse é um dos resultados apontados por estudo realizado pelo Núcleo de Inteligência Social (NIS), parceria entre PUC Minas e ChildFund Brasil, apresentados na manhã desta quarta-feira, 16 de dezembro. Os dados na íntegra estão disponíveis na página do NIS ou pelo canal do ChildFund no YouTube.
O Índice de Pobreza Multidimensional (IPM), criado pelo NIS, extrapola o fator renda, mensurando a pobreza a partir da privação de necessidades essenciais ao desenvolvimento e qualidade de vida, como o acesso à educação e à saúde, entre outras.
"O NIS é fruto do entendimento de que o meio acadêmico pode trazer contribuições para questões relacionadas à erradicação da pobreza. É neste ambiente que se encontram o conhecimento e a prática. Quando a Universidade dialoga com quem atua e, juntos, contribuem para erradicação da pobreza", explicou o coordenador do NIS e professor do Programa de Pós-graduação em Geografia da PUC Minas, Paulo Fernando Braga Carvalho
Para o diretor-executivo da Child Fund Brasil, Gerson Pacheco, o lançamento dos dados é uma celebração desta grande conquista que é o NIS. "O NIS é um agente de transformação social brasileira, uma vez que diz onde está a pobreza e a extrema pobreza. A pobreza tem endereço porque duas grandes organizações lideraram esse trabalho. O NIS é um grande farol para o Brasil, para a transformação social que o país precisa para reduzir a desigualdade", assinalou.
Dados
O levantamento, baseado em dados do Censo Demográfico de 2010 (o mais atual) do IBGE, aponta que a pobreza multidimensional no Brasil naquele ano atingia 1.075.360 domicílios, o equivalente a 1,9% do total. Os residentes em domicílios pobres multidimensionais somavam 4.494.757 (2,4%) e as crianças de zero a 11 anos eram as que proporcionalmente mais conviviam com estados de pobreza multidimensional, na comparação com o restante da população, somando 1.165.276 (3.3%) pessoas.
A escolha das dimensões e dos indicadores também levou em conta a compatibilização com dados que poderão ser extraídos do próximo Censo Demográfico, que seria realizado em 2020. Esta opção metodológica permitirá, além das análises espaciais, estudos sobre evolução da situação da pobreza/vulnerabilidade no Brasil ao longo do tempo.
Os estados de vulnerabilidade ou de risco de cair na pobreza foram identificados em 4.442.554 (7,7%) domicílios e 16.693.098 (8,8%) pessoas. Mais uma vez, as crianças eram as mais afetadas, proporcionalmente: 3.672.946 (10,3%) pessoas naquele ano.
As maiores incidências de pobreza multidimensional foram observadas na Região Norte do País, com exceção do estado de Tocantins, na porção norte do Estado do Mato Grosso e norte do estado do Maranhão. Em números absolutos, as regiões Norte e Nordeste concentram 65,5% da pobreza multidimensional do país. Os resultados apontam ainda que a pobreza multidimensional atinge de forma mais abrangente as populações que vivem em áreas rurais e em municípios de até 50 mil habitantes e, também atinge com maior frequência, jovens, indígenas, pretos e pardos.
Para o ChildFund Brasil o IPM-NIS tem sido fundamental para direcionar as estratégias de intervenção social não só pela identificação dos estados e municípios de maior pobreza multidimensional, mas também por mostrar em quais dimensões os domicílios apresentam maior vulnerabilidade e risco de pobreza. Neste sentido, a proposição de programas e projetos são mais assertivos, tendo em vista que o índice permite constatar dentre os 13 indicadores quais as principais áreas de prioridade e que requerem maior atenção e urgência para superação da pobreza.
Na PUC Minas, o trabalho do NIS envolve professores dos programas de pós-graduação em Geografia – Tratamento da Informação Social e Ciências Sociais, além de alunos bolsistas de graduação, mestrado e doutorado. O NIS conta ainda com a participação de outras áreas do conhecimento: Psicologia, Ciências Exatas e Informática e Comunicação.
O que é o IPM-NIS
O IPM-NIS é um indicador de mensuração da pobreza que identifica as pessoas pobres a partir de um conjunto de dimensões (saúde, educação, trabalho, padrão de vida). Entre eles, os indicadores de frequência à escola e distorção idade-série das crianças em idade escolar e de escolaridade dos membros adultos, por exemplo, são considerados na dimensão educação. Já o indicador de mortalidade infantil compõe a dimensão de saúde.
No âmbito do trabalho, são utilizados os indicadores de trabalho infantil, desocupação/desemprego e trabalho informal dos membros adultos. Por fim, a perspectiva padrão de vida é composta por material do domicílio, abastecimento de água, saneamento, tratamento do lixo, densidade morador por dormitório e consumo.
A escolha pelo IPM busca um alinhamento com o debate internacional atual sobre mensuração da pobreza multidimensional, pois segue as recomendações da ONU para o monitoramento dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS). “Esse alinhamento se faz ainda mais necessário diante do cenário atual, em que podem ocorrer retrocessos sociais e aprofundamento de problemas estruturais, como anunciado pelo mais recente informe da ONU sobre os ODS no contexto da pandemia da Covid-19”, ressalta o professor Paulo Fernando Carvalho.